Nasci numa cidade mínima de Minas Gerais - Jequeri -, tão pequena que quase se esmaece em minha vetusta memória. Mas não posso esquecer aquela cidadezinha qualquer, porque lá está enterrado o meu pai, vindo do Líbano, e também lá perdi meu amigo de infância - Nicolau Alves de Laia, o Nico -, morto aos 40 e poucos anos. Não esqueço a paisagem jequeriense, feita de montanhas, cachoeiras e o belo Rio Casca. Mas, quando me perguntam de onde sou em Minas, respondo, para evitar ter que situar geograficamente meu real torrão natal, que é Mariana, uma lindíssima cidade barroca, onde passei parte da infância e toda a minha adolescência, recebendo uma educação erudita. Geralmente, digo a todos que sou de Saquarema-RJ, cidade-musa, onde atraquei, há 30 anos, o barco de minha existência e onde criei um filho e crio três adoráveis netinhos.
Hoje, é "Corpus Christi", festa da liturgia católica, que celebra a eucaristia. Fui ver, na Vila, os tapetes que enfeitam todo o centro de nossa cidade. Lembrei-me de Jequeri, onde eram lindas as festas religiosas, que quebravam a monotonia da rotina interiorana. Lá, "Corpus Christi" era a mais luxuosa das festas, porque havia um altar em cada esquina, perante o qual parava a procissão para se rezar. Aqui, em, Saquarema, cidade praiana, o sal do mar vira tapete, o sal é colorido e forma imagens e frases, de caráter religioso. Há uma euforia, porque crianças, jovens, adultos empenham-se na fatura do tapete, que se quer o mais belo, mesmo se não há um concurso de tapetes. Nelsinho, o pintor de Saquarema, preparava-se, com sua equipe, para montar dois tapetes, justamente em frente à casa de Walmir Ayala, o poeta de Saquarema. Será, em todo caso, uma obra de arte precária, que vai durar até às 16hs, quando a procissão passar obre os quase 300 tapetes. Vendo a elaboração dos tapetes, que serão anônimos, mas por mãos fervorosas e alegres, notei que há uma marcação, como coreografia, e uma enumeração. Percebi, também, que esses efêmeros tapete de sal continuam o tapete de pedra, que desce da Igreja de Nossa Senhora de Nazareth, ícone de nossa cidade. Na Internet, aprendi que "o costume de enfeitar as ruas surgiu em Ouro Preto, cidade histórica do interior de Minas Gerais. No Sul do Brasil, chegou com os imigrantes açorianos. Nas cidades que preservam a tradição, é comum ornamentar as ruas por onde passará a procissão com um tapete desenhado com serragem tingida, palha, borra de café, areia e grãos. Toda população participa do trabalho e o resultado é um grande mosaico, com símbolos cristãos, locais e nacionais, compondo uma obra de arte altamente efêmera, pois ela vai durar apenas até a passagem dos devotos". Em Petrópolis, cidade serrana do Estado do Rio, por exemplo, os tapetes são feitos de borra de café e de serralho.
Na festa de "Corpus Christi", as ondas saquaremenses são tapetes de sal e os surfistas se confundem com os artistas e os artesãos que desenham, no chão da Vila, sua fé.
quinta-feira, 3 de junho de 2010
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