domingo, 10 de janeiro de 2010
MOZART, ARTE DIVINA
Foi em 1984, justamente quando do lançamento do filme "Amadeus", escrito por Peter Shaffer, dirigido por Milos Forman, que o vi, guardando, desde então, uma lembrança muito vívida dos arrepios que aquelas três horas de duração me provocaram. 26 anos depois, eu me pergunto o que me impressionou tanto naquele filme, premiado oito vezes com o Oscar. Não me lembro. Lembro-me do encantamento total, agora renovado e ampliado. Terei eu mudado, aprimorando minha sensibilidade, totalmente voltada para a música, que sempre considerei a mais sublime de todas as artes; é a música irmã-siamesa da Literatura, à qual me devoto dia e noite. F. Murray Abraham, que encarna, diabolicamente, Antonio Salieri (1750-1825), rival, no filme, de Mozart (Johan Chrysostomos Wolfgang, 1756-1791) marca a história do cinema universal como ator paradigmático; já o personagem Mozart, representado por Tom Hulce, realça,de maneira brilhante, a obscenidade, a ingenuidade e o caráter infantilmente alegre do famosíssimo artista austríaco. É o filme uma ode a Mozart, ao mesmo tempo que é o ódio, destilado por Salieri, arquétipo de inveja, assim como Otelo o é do ciúme. Para além de Mozart e Salieri, há um terceiro protagonista, a música, que não é pano de fundo das emoções e das imagens, mas fulgurante figura. Como outro personagem shakesperiano - Hamlet -, Mozart é assombrado pelo fantasma do pai, que o provoca a compor obras-primas. Jamais haverá uma leitura da obra mozartiana como a feita por seu desafeto, que tanto o admirava quanto o odiava. Na corte de Joseph II, o menino Mozart é o "enfant gâté", que gera inveja, ciúme e rivalidade. Revendo, mais embevecido que nunca, esse filme, lembrei-me de vários amigos, amantes da arte: o Joel Cardoso foi quem me surgiu primeiro, porque toca piano no meio da selva amazônica; o Padre Joaquim Meireles Maia, que, a essa altura da eternidade, já está no céu, ao lado de Beethoven, como ele queria, reapareceu-me, em copiosas lágrimas; Geruza Coutinho, minha melhor amiga habitante no exterior me veio à mente pela incrível semelhança física com a atriz que faz o papel da esposa Constanza: Elizabeth Berridge. Face ao diabólico Salieri, esplende "a voz de Deus", encarnada em Mozart, tomado pela paixão musical, pela gaia arte, pela luxúria da ópera. "Harmonia perfeita", "beleza absoluta", "a própria voz de Deus" são expressões que pontuam o filme, compondo o retrato de Mozart, que o filme "Amadeus" eterniza de outra forma. O "Requiem" mozartiano não é música de depressão, tampouco se trata de "fogos de artifício", mas glorificação do que há de mais divino no ser humano, daquilo que o torna semelhante à divindade. Filmado em Praga (cidade em que me apaixonei pela primeira vez), no mesmo teatro em que estreou "Don Giovanni", "Amadeus" celebra, divinamente, a música, oferecendo, "per omnia secula seculorum", um êxtase.
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